Então vejamos:
Um "DEVOTO(A)" que cometa assassinato, estupro, tráfico de armas e drogas, pedofilia etc, etc... não deve ser julgado num Tribunal de Justiça porque possui o estatuto de "DEVOTO(A)" !!!
É isto?
Não me parece.
"...Ninguém deve se aproveitar deste verso para cometer tolices e achar que continua sendo devoto...."
No Bhagavad Gita, Sri Krsna diz:
"Mesmo que alguém cometa acções das mais abomináveis, se estiver ocupado em serviço devocional deve ser considerado santo porque está devidamente situado em sua determinação." Bg 9.30
No significado, Srila Prabhupada explica:
"Portanto, quem está em consciência de Krsna e com determinação ocupa-se no processo de cantar Hare Krsna Hare Krsna Krsna Krsna Hare HareHare Rama Hare Rama Rama Rama Hare Haredeve ser considerando como estando na posição transcendental, mesmo que fortuita ou casualmente ele caia.As palavras sadhur eva, "ele é santo", são muito enfáticas. Segundo esta advertência aos não devotos, não se deve zombar de um devoto só por causa de uma queda acidental; ele ainda deve ser considerado um santo, mesmo que tenha acidentalmente caído.E a palavra mantavyah dá ainda maior ênfase.
Se a pessoa não seguir esta regra e zombar da queda acidental do devoto, então, estará desobedecendo à ordem do Senhor Supremo. A única qualificação do devoto é estar firme e exclusivamente ocupado em serviço devocional.
No Nrsimha Purana, há a seguinte afirmação:
O significado é que mesmo que alguém se ocupe por completo no serviço devocional ao Senhor e às vezes cometa actos abomináveis, tal atitude deve ser considerada como as manchas da Lua, que se assemelham à forma de um coelho. Estas manchas não impedem a difusão do luar. Da mesma forma, o facto de um devoto acidentalmente sair do caminho do caráter santo não o torna abominável."
"Por outro lado, não se deve interpretar que um devoto no serviço devocional transcendental pode agir de todas as maneiras abomináveis; este verso refere-se apenas a um acidente devido ao forte poder das ligações materiais. O serviço devocional é mais ou menos uma declaração de guerra contra a energia ilusória. Enquanto não se for bastante forte para combater a energia ilusória, poderá haver quedas acidentais. Mas quando o devoto é bastante forte, ele deixa de sujeitar-se a estas quedas, como já se explicou. Ninguém deve se aproveitar deste verso para cometer tolices e achar que continua sendo devoto. Se, com o serviço devocional, ele não melhorar seu caráter, então, deve-se entender que ele não é um devoto elevado."
http://en.wikipedia.org/wiki/Kirtanananda_Swami
No "Sri Harinama Cintamani", Srila Bhaktivinoda Thakur define Hrdaya Daurbalyam:
Hrdaya Daurbalyam é uma fraqueza, uma debilidade do coração, que causa dificuldade no avanço devocional.
Todos nós, como seres humanos, temos diferentes tipos de fraquezas.
No "Amrta Vani", a seguinte pergunta é feita à Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur:
Qual é a diferença entre fraqueza (Hrdaya Daurbalyam) e enganação?
"Enganação e fraqueza são duas coisas separadas. Pessoas desprovidas de uma propensão enganosa alcançam a perfeição da vida, mas um enganador nunca é bem sucedido. Vaisnavismo é um outro nome para simplicidade. Enganador é um não devoto. Pessoas sinceras podem ter fraquezas, mas elas não enganam. Os enganadores dizem uma coisa e fazem outra. Pessoas sinceras são confrontadas com suas fraquezas e tentam superá-las, enquanto os enganadores ficam enlouquecidos pelas suas conquistas.
Se nós temos fraquezas e temos Anarthas suficientes para durarem milhões de anos, não somos tão desafortunados como aqueles que possuem uma propensão enganadora."
Podemos observar que existe uma grande diferença entre fraqueza (Hrdaya Daurbalyam) e enganação.
Gopala Prabhu cita: "Em resumo: como fonte conceitual e motivacional, o Manu Samhita é uma obra estupenda e divina. Mas quanto aos valores e regras necessários para os devotos, os Gosvamis e Prabhupada já os colocaram em seus importantes livros."
Sim, e a ISKCON os colocou na sua Constituição de Leis:
8 - Membros da ISKCON
8.4.5 Expulsão (Excomunhão) em:
http://www.iskconcgb.net/Estatuto/leis.asp
Por exemplo, no caso de algum devoto ter cometido algum crime sério e tenha sido condenado e cumprido pena somente poderá ser reintegrado com a aprovação completa de todos os membros do GBC e não somente 2/3.
E finalmente um último ponto.
Nós sabemos que aqueles que aceitam o serviço devocional ao casal divino Sri Sri Radha Krsna tem o seu Karma amenizado.
Amenizado não significa extinto.
Ajamila é um caso de Hrdaya Daurbalyam.
Vosso servo
Prahladesh Dasa
Gopala Prabhu escreveu:
Querido Prabhuji Krishna Shaka,
Minhas reverências,
Todas as glórias a Srila Prabhupada!
Desculpe-me não ter respondido antes: alguns assuntos administrativos ocuparam o meu tempo disponível na Internet.
Não estou ofendido não, e pelo contrário, muito feliz em saber dos seus estudos: devotos bem qualificados e versados são muito importantes para a ISKCON. Parabéns, também, pela sua consciência de Prabhupada.
Quanto ao meu argumento, creio, se me permite dizer, que pode ter passado despercebido o termo "instruções operacionais". Sabemos que toda lei (dharma), na sua operacionalização, deve envolver algum tipo de punição para que se torne efetiva. De outro modo, pode se tornar 'letra morta".
Ocorre que as punições do Manu Samhita, como você bem observou melhor que eu mesmo, não são "prontamente aplicáveis" nos dias de hoje. Como citei na minha primeira mensagem, isso já fora apontado pelo Senhor Nityananda a mais de 500 anos atrás (não sendo, portanto, um argumento materialista).
A solução do impasse está na sua própria agumentação:
Prabhupada dava importância ao "Código de Manu", está lá em seus ensinamentos e os Gosvamis de Vrndavana retiraram do "Código" os valores e regras necessários para os devotos, Shrila Prabhupada colocou tudo isso em seus livros.
No livro ... o autor explica que ... regras "cruéis" ... não há registro de jamais terem sido aplicadas.
Nós não vamos aplicar isso, graças aos divinos ensinamentos nos maravilhosos livros de Sua Divina Graça Om Vishnupada Pramahamsa 108 Shri Shrimad A. C. Bhaktivedhanta Swami Prabhupada.
Os brahmanas são os defensores da cultura védica e nós não somos brahmanas se não conhecemos os Vedas, e Shrila Prabhupada escreveu importantes livros para nos ensinar isso.
Em resumo: como fonte conceitual e motivacional, o Manu Samhita é uma obra estupenda e divina. Mas quanto aos valores e regras necessários para os devotos, os Gosvamis e Prabhupada já os colocaram em seus importantes livros.
Também é importante notar que, com relação às punições, não só o "cortar a língua", mas praticamente todas as punições mais severas, tais como a pena de morte, quase sempre eram, em vista do que nós chamaríamos hoje de "apelações em diversas instâncias", comutadas para "mais brandas", tais como humilhação pública (cortar metade do cabelo e bigode) ou desterro (para fora do pais ou para certas áreas restritas dentro do país).
Enfim, era mais como a história de Narada Muni e a serpente: nem sempre é preciso morder, mas nade impede de mostrar os dentes, quando necessário. Alguns exemplos que me ocorrem, de pronto, são o desentendimento entre o senhor Siva e seu sogro Daksa, a argumentação com que Vasudeva evitou a execução sumária de sua recém esposa Devaki pelo seu cunhado Kamsa e, principalmente, a forma como Parksit lidou com a agressão de Kali à Mãe Terra, Bhumi.
Porém, estamos em plena Kali yuga. A tendência natural das pessoas é se desentenderem pelas menores coisas, e aplicarem nesses desentendimentos as maiores punições. Basta olhar, mesmo de relance, as notícias dos jornais, revistas e tv, para perceber este ponto.
De outro lado, quando são, de fato, as causadoras dos problemas, pedem para elas mesmas indulgência e perdão. Estes dois aspectos de Kali yuga, desavenças em abundância, e hipocrisia (dois pesos e duas medidas nos julgamentos), tornam a aplicação prática de punições severas uma grande dificuldade nos dias atuais.
Lembremos também que o principal julgador e executor da Lei de Manu deve ser um rei santo (rajarsi) que, antes de qualquer punição, deve dar o exemplo mais elevado de comportamente de acordo como o Dharma (Bg 3.20-21 e 4.1-2).
Por fim, mas não esgotando o assunto:
Manu ainda é o pai da humanidade e o Senhor Yamaraja ainda nos julga após a morte de acordo com aquelas regras.
As leis de Manu são para a humanidade, mas a humanidade atual, em grande parte, não seria considerada humana pelos padrões védicos: teriam que pelo menos reconhecer e tentar seguir, na medida do possível, os 4 princípios e alguma forma de transcendentalismo (espiritualidade), para poderem ser considerados de comportamento humano (atato brahma jijnasa).
As punições aplicadas por Yamaraja, como explanadas no 5º Canto do Srimad-Bhagavatam, são muito nesse sentido de punir um comportamento animal em alguém que, por grande boa fortuna, assumiu a forma humana, e a desperdiçou produzindo karma ruim (vikarma). Inclusive, muitas das punições são aplicadas por animais, além dos próprios Yamadutas serem um pouco "monstruosos" e animalescos.
Os devotos, como aceitam e tentam seguir, na medida de suas respectivas capacidades, esses 4 princípios, e cantam (mesmo que de forma vacilante e desconcentrada/ distraída) os Santos Nomes do Senhor (o espiritualismo chamado Mantra-yoga, ou também Bhakti-yoga) , não estão sob a jurisdição de Yamaraja. A esse respeito, ver o caso de Ajamila e os mensageiros de Vishnu e Yamaraja. Inclusive, esses princípios e espiritualidade não estão restritos apenas aos vaishnavas.
Querido Krishna Shaka, parabéns pelos seus esforços em consciência de Krishna, obrigado por compartilhar sua realizações conosco, e boa sorte nos seus estudos.
Seu servo,
Gopala Dasa (HDG)
Recife-PE - Brasil
Em 1º de fevereiro de 2009.
Krishna Shakha Prabhu escreveu:
Prabhu Gopala, por favor, aceite minhas respeitosas reverências. Todas as glórias a Shrila Prabhupada. Prabhu, obrigado pelos seus ótimos comentários e obrigado também pela sua exemplar atitude diante das correções, tão iluminantes, de Praladesha prabhu para a parte final do seu e-mail.
Meu comentário não é tão iluminante assim, mas eu encontrei algumas coisas interessantes sobre a parte final da sua mensagem também. Para relembrar vou destacar a parte que estou comentando:
Gopala dasa - Os devotos, como aceitam e tentam seguir, na medida de suas respectivas capacidades, esses 4 princípios, e cantam (mesmo que de forma vacilante e desconcentrada/distraída) os Santos Nomes do Senhor (o espiritualismo chamado Mantra-yoga, ou também Bhakti-yoga), não estão sob a jurisdição de Yamaraja.
A esse respeito, ver o caso de Ajamila e os mensageiros de Vishnu e Yamaraja. Eu concordo com você em parte, mas o Senhor Krishna, em seus passatempos tomou algumas precauções para mostrar a seus devotos que eles não podem, confiando na grandeza de seu Senhor, considerar-se acima das regras, isso é muito arriscado.
Para demonstrar isso, Shri Krishna, no coração, inspirou os jovens da dinastia Yadu a tentarem uma brincadeira com os sábios brahmanas, o que custou a eles a maldição que destruiu toda a dinastia Yadu, Śrīmad Bhāgavatam 11.1.13-16.
Os acharyas explicam que o Senhor Krishna "temia" que os membros futuros dessa dinastia, sendo muito poderosos, se tornariam muito orgulhosos, por serem parentes de Krishna e assim eles acabariam destruindo todo o planeta, o que foi um dos motivos para o Senhor retirar daquela maneira todos os seus familiares do mundo.
A parte minha que você citou em seu texto: "Manu ainda é o pai da humanidade e o Senhor Yamaraja ainda nos julga após a morte de acordo com aquelas regras.". Nessa parte eu estou tentado enfatizar o ponto de que os devotos devem manter-se fiéis ao Dharma e por isso citei o Senhor Yamaraja, também conhecido como "Dharmaraja" e devem evitar a vida pecaminosa, adharma.
Se um devoto comete atividades pecaminosas, seu avanço espiritual e compreensão da Consciência de Krishna ficas comprometidos. Esse conhecimento não é simplesmente intelectual, Krishna o revela no coração ao devoto que tem fé no mestre espiritual, nas palavras que vem do Parampara e são reveladas nos livros de Shrila Prabhupada [ŚU 6.23], ver o Bhagavad Gita, 6.47.yasya deve parā bhaktir yathā deve tathā gurau.tasyaite kathitā hy arthāḥ prakāśante mahātmanaḥ.
O caso de Ajamila pode ser tido como um "precedente", mas não permite estabelecer um limite claro para a "jurisdição" de Yamaraja sobre os devotos do Senhor Krishna. Lembre-se que Yamaraja é também um grande devoto, um dos doze Mahajanas e seu serviço de cuidar das almas condicionadas é um serviço devocional. Veja que estamos todos em casa :)
Caso interessante do Néctar da Devoção:(Eu não tenho agora o livro em português, então tive que traduzir do que está na internet: http://prabhupadabooks.com/) "Quando um devoto, lamentando por suas abomináveis atividades passadas, mostra sintomas especiais em seu corpo, seu sentimento é chamado de êxtase do serviço devocional em horror. Isto é causado pelo despertar de sua Consciência de Krishna (...)Tal percepção é possível apenas para aquele que é despertado para a Consciência de Krishna e se torna completamente consciente da natureza abominável de seu corpo material. (...)Há uma afirmação similar de uma pessoa caída na condição de vida infernal.
Ele dirige-se assim ao Supremo: 'Meu querido Senhor, Yamaraja colocou-me numa situação a qual é cheia de sujeira e odores detestáveis. Há tantos insetos e vermes, rodeado pelas fezes deixadas por diferentes tipos de pessoas doentes. E depois de visualizar essa cena horrível meus olhos estão ficando doloridos e estou ficando quase cego.
Por isso eu oro. Oh meu senhor, oh Salvador das condições de vida infenal. Eu caí dentro deste inferno, mas eu devo sempre tentar lembrar seus santos nomes e dessa forma eu devo tentar manter meu corpo e alma juntos.' Este é um outro exemplo de amor extático por Krishna numa situação abominável." ( The Nectar of Devotion - 1970 Edition : NoD 48: Dread and Ghastliness : Ghastliness :)
Assim, todos nós, antes de fazermos besteira e principalmente maldade com os outros devotos, devemos lembrar dessa parte do Néctar da Devoção.
Seu servo,
Krishna Shakha dasa